No final de 2010, o universo dos planeadores e gestores de cidades ficou chocado com a atitude de uma câmara municipal do Minho ao decidir o coordenador do processo do Plano Director Municipal (PDM) apenas porque o especialista fez a diferenciação entre a cidade extraordinária e a cidade ordinária.
O político em questão, por mera ignorância linguística e académica, entendeu que o arquitecto em causa estava a insultar o município quando o que o Homem em questão queria dizer era tão somente isto: a autarquia não pode olhar apenas para a cidade extraordinária (leia-se aquela que serve de cartão de visita) mas tem obrigação de ver o território como um todo e, em especial, a cidade ordinária (leia-se aquela onde se vive, se trabalha e se passa a maior parte do tempo).
Trata-se afinal de fazer valer o paradigma do Marketing de Cidades e da Gestão Cultural de Território: nenhuma cidade pode querer ser atractiva sem ter atracções mas também não pode dedicar-se apenas aos visitantes esquecendo os residentes.
A Cidade é um “ser” cultural por inerência desde o seu nascimento e este caso demonstra bem o que vai andando mal no universo dos executivos municipais e das teias políticas locais, regionais e nacionais: os pelouros da Cultura não podem ser meros repositórios de eventos artísticos (alguns deles de carácter caprichoso e duvidoso) ou subsídios a associações recreativas e culturais porque, lembre-se repetidamente, a arte foi e será sempre o adorno do “ser” cultural que é a Cidade); integrar a Cultura nas mãos de que gere a Educação e colocar a gestão do espaço urbano nas tarefas de outrem é o mesmo que tomar um cappucino na Praça da Duomo de Milão num copo de plástico com uma palhinha descartável.
Vem esta dissertação a propósito de duas notícias algo contraditórias que, ao leitor comum, nada têm de nexo ou causalidade: na mesma semana em que se sabe que a câmara municipal decide atribuir o título de cidadão de mérito a um arquitecto que recebeu milhares de euros para executar uma obra de arte que agora é um espaço público com o argumento de que esse edifício capitalizou a visibilidade de Viana, fica tambéma saber-se que a autarquia decidiu, mais uma vez, “ameaçar” os proprietários das dezenas de obras de arte automobilísticas que estão abandonadas pela cidade que irá remover esse entulho mas, (imagine-se…) depois de notificados e cumpridos os prazos legais.
São estas afinal duas não notícias que envergonham a cidade ordinária. Siza Vieira tem recebido prémios pela biblioteca que desenhou mas isso torna-o um cidadão de mérito de Viana? Já anteriormente se deu louvores a outro artista (?) pelo simples facto de ter sido pago a peso de ouro para colocar em Viana duas aberrações urbanas (para não se avançar com outras discussões históricas que lhe serviram de base…). E que dizer de José Saramago que tão bem descreveu a cidade extraordinária (antes das intervenções do Programa Polis) num documento que hoje circula por todo o mundo? Não terá sido ele um verdadeiro cidadão de mérito?
Quanto ás obras de arte automobilísticas o Museu de Viana decidiu dar uma ajuda aos serviços municipais na esperança de que a cidade ordinária comece a receber mais atenção por parte dos gestores (?) políticos do espaço urbano. Porque não obrigam os Presidentes das Juntas de Freguesias, agora pagos com ordenados do erário público, a fiscalizar os seus eleitores???
E fica esta outra ideia: se a cidade não quer ter automóveis em nome de uma moda de pedonização que nunca teve justificação académica ou histórica porque não se disponibiliza veículos como os da fotografia em parques de estacionamento gratuitos?
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